Língua franca

Nomes de maior destaque da cena hip-hop brasileira, Emicida e Rael lançam na sexta-feira, 26, o álbum “Língua Franca”, em parceria com os rappers portugueses Capicua e Valete. Com repertório de dez faixas inéditas, o projeto já havia apresentado os singles “Ela” e “A Chapa É Quente”. Celebrando a língua comum entre os dois países, o álbum contou com a produção de Kassin, que já trabalhou com nomes como Marisa Monte e Gal Costa, Fred Ferreira, integrante da Banda do Mar, e Nave. O projeto é uma colaboração entre os braços brasileiro e português da Sony Music e o selo Laboratório Fantasma.

Minha Pátria É Minha Língua

(por Caetano Veloso)

O rap é a língua franca da diáspora negra e, já hoje, de algumas gerações de pessoas muito jovens, de todas as cores, nas cidades do mundo. O português é a língua franca da Damaia, do Cachoeira, do Grajaú, do Porto, de São Tomé e Príncipe, de Cabo Verde, de Angola, de Moçambique, do Brasil e de Portugal. São muitas camadas de desqualificação superpostas, muitas camadas de opressão. Muita ginga. Capicua (com seu nome artístico de origem catalã, em que significa palíndromo: seu nome de batismo é Ana) é branca; Valete é negro; Emicida e Rael são mestiços. Os dois primeiros são portugueses; os dois últimos, brasileiros. Os quatro falam a mesma língua. A língua franca do rap. E a língua franca da lusofonia. O simples fato de tê-los aqui reunidos é já, a meus olhos mulatos do recôncavo baiano, acontecimento de grande monta. Mas há Kassin, Nave e Fred Ferreira, além de Sara Tavares, destilando o que é moderno dos dois lados do Atlântico. Creio que devemos muito de tudo isso a Emicida e a seu irmão Fióti (que é citado numa das muitas rimas): as movimentações desses dois duendes da periferia paulistana e da vida online são sempre consequentes. Para mim, é todo um mundo humano que se representa nessa associação de MCs. Todo um mundo que aprende a levantar-se. Eles trocam mutações de palavras da língua inglesa (e de nomes de pioneiros anglófonos) ocorridas na gestação do hip-hop no Brasil e em Portugal, misturam-nos com os mitos africanos, afro-baianos, afro-brasileiros, afro-lisboetas, trazem tudo para dentro dos coloquialismos de suas quebradas transatlânticas e enriquecem a nossa vida. Dão-nos esperança. Criam esperança. São os gênios invisíveis que se fazem ver. Falam aos amigos. Cantam a deusa do ébano. Guerreiam o ego. Abrem trilhas futuras. É disso que todos precisamos. Porque, como escreveu Bernardo Soares, que é um dos nomes de Fernando Pessoa: “Minha pátria é a língua portuguesa”.

Repertório

  • Amigos

(Intérpretes: Emicida, Rael Capicua e Valete / Composição: Emicida, Rael, Nave, Kassin, Capicua, Valete e Fred)

  • (A)tensão!

(Intérpretes: Emicida e Capicua / Composição: Emicida, Nave, Kassin, Capicua, Pedro Mauricio e Fred)

  • Gênios Invisíveis

(Intérpretes: Emicida, Rael, Capicua e Valete / Composição: Emicida, Rael, Nave, Kassin, Capicua, Valete, Zé Nando Pimenta, Pedro Santos, Sergio Freitas, Fred)

  • AFROdite

(Intérpretes: Emicida, Capicua e Rael / Composição: Emicida, Rael, Nave, Kassin, Capicua, Sara Tavares e Fred)

  • Egotrip

(Intérpretes: Emicida e Capicua / Composição: Emicida, Nave, Kassin, Capicua, Coruja e Fred)

  • A Chapa É Quente

(Intérpretes: Emicida e Rael / Composição: Emicida, Nave, Kassin e Fred)

  • Modo Vôo

(Intérpretes: Emicida, Capicua e Rael / Composição: Emicida, Rael, Nave, Kassin, Capicua e Fred)

  • Vivendo Com A Morte

(Intérpretes: Rael e Capicua / Composição: Rael, Nave, Kassin, Capicua e Fred)

  • Ideal

(Intérpretes: Emicida, Capicua e Rael / Composição: Emicida, Rael, Nave, Kassin, Capicua e Fred)

  • Ela

(Intérpretes: Emicida, Rael, Capicua e Valete / Composição: Emicida, Rael, Nave, Kassin, Capicua, Valete e Fred)